quinta-feira, 25 de junho de 2015

Da importância do consentimento informado para o ato médico

Crédito: RefJur
No mundo contemporâneo a informação é essencial, e cujo reconhecimento pela sociedade dos direitos das pessoas está repercutindo nas relações médico x paciente, em especial quando se trata de decidir sobre tratamento, exames e todo tipo de terapia.

Para que isso ocorra, o paciente deve pensar, agir e decidir de maneira autônoma e de livre escolha, sendo da competência do médico instruí-lo e orientá-lo de maneira clara e acessível.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem artigo XIX assegura que “Todo homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”.

Segundo o Conselho Regional de Medicina de São Paulo - CREMESP, “O Termo de Consentimento Esclarecido refere-se ao documento assinado pelo paciente, ou responsável, consentindo ao médico a realização de determinado procedimento diagnóstico ou terapêutico, após haver recebido informações pertinentes. Tem como finalidade garantir a autonomia do paciente e delimitar a responsabilidade do médico que realiza os procedimentos.”.

Renomados doutrinadores ensinam que “A busca incessante por novos conhecimentos e, consequentemente, por novas tecnologias é uma característica própria do homem. As pesquisas científicas são responsáveis por esses avanços e, num determinado momento, o desenvolvimento de experimentos deverá envolver seres humanos. A história relata casos de abusos em nome da ciência. (...) O pilar principal desse respeito é, sem dúvida alguma, o consentimento livre esclarecido.” (Laís Záu Serpa de Araújo Araújo).

Léo Meyer Coutinho afirma: “...é fundamental o médico ter consciência de que o paciente não é de sua propriedade. Ele tem, e deve ser respeitada, vontade própria. Até mesmo para prescrever os medicamentos o médico deve informá-lo das finalidades.”

Surgiu assim, a necessidade de que todo o procedimento voltado à saúde seja esclarecimento ou informado ao paciente, bem como colhida a sua autorização, já que a primeira visa dar conhecimento e proporcionar questionamento, e a segunda, a garantia de ação terapêutica do profissional da saúde.

À nova concepção denominou-se consentimento esclarecido ou informado, que também se encontra dentro da ordem jurídica decorrente das alterações inseridas no atual Código Civil, além do Código de Defesa do Consumidor e do Código de Ética Médica dentre outros diplomas legais.

E assim, diz o artigo 22 do Código de Ética Médica que é vedado ao médico “Deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte.”

Devem assim ser adotados novos modelos de comportamento, administração e gestão de saúde, tendo em vista as implicações decorrentes da responsabilização por danos pessoais, patrimoniais e morais, derivados da prestação de serviços de saúde.

Diversos procedimentos médicos normalmente realizados acarretam riscos, apesar de todo o cuidado e conhecimento técnico do profissional que o executa, sem que com isto o responsabilize, já que prevista a possibilidade pela literatura médica.

Não se pode esquecer, que o médico age diretamente junto ao paciente numa relação estreita e de confiança mútua, razão maior para que mereça o esclarecimento necessário a respeito dos efeitos clínicos, adversos e colaterais.


E sendo desta forma, o paciente deve obrigatoriamente ser esclarecido sobre os riscos, efeitos colaterais e adversos, cujos artigos 13 e 15 do Código Civil guardam os princípios da autonomia e da disposição sobre o próprio corpo, os quais se efetivam pelo exercício da concordância informada.

Assim sendo, “...a decisão deve ser voluntária e realizada por uma pessoa autônoma e capaz, visando a aceitação de um tratamento específico ou experimentação, sabendo da natureza do mesmo, das suas consequências e dos seus riscos”. (Saunders CM, Baum M, Houghton J. Consent, research and the doctor-patient relationship. In Gillon R, editor: Principles of health care ethics. London Johyn Wiley & Sons 1994; 457-70).

Evidentemente que a liberdade de fazer ou não fazer também deve ser respeitada até o limite da exceção (risco iminente de vida), que traduz num direito natural desde a concepção do homem, tratado inclusive pela Declaração Universal dos Direitos do Homem já referido neste texto.

O mundo atual, portanto, não mais aceita a intervenção sobre a pessoa e sua dignidade e liberdade, já que cada indivíduo é um mundo em si mesmo, e como tal não pode ser invadido indiscriminadamente.

O dever de prestar informação também está presente no Código de Defesa do Consumidor, artigo 31 em especial: “Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.”.

Os Tribunais Brasileiros enfrentam a questão quanto ao dever de prestar informação, e assim destacamos a seguinte decisão: “Responsabilidade civil. Médico. Consentimento informado. A despreocupação do facultativo em obter do paciente seu consentimento informado pode significar, nos casos mais graves, negligência no exercício profissional. As exigências do princípio do consentimento informado devem ser atendidas com maior zelo na medida em que aumenta o risco, ou o dano”. (STJ. REsp 436.827-SP).


Finalizando, como diz Kant, “O homem, e, duma maneira geral, todo o ser racional, existe como um fim em si mesmo, não como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Pelo contrário, em todas as suas ações, tanto nas que se dirigem a ele mesmo como nas que se dirigem a outros seres racionais, ele tem sempre de ser considerado simultaneamente como um fim.”.

Ernesto Beltrami Filho 

Formado pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, ex-sócio da Zênite Assessoria e da MSCB Advogados. Acadêmico da ANSP (Academia Nacional de Seguros e Previdência) na qual ocupa a 93º Cátedra de ‘Responsabilidade Civil Profissional’, Membro da Seção Brasileira da Association Internationale de Droit dês Assurances (AIDA), especializado em direito médico, direito securitário, direito dos transportes e responsabilidade civil. Articulista no jornal ABRALAPAC e Revista NewsLab. Especializado em Responsabilidade Civil na Área da Saúde pela Fundação Getúlio Vargas, autor de diversos artigos sobre temas da sua  especialidade e da obra ‘Gestão de Risco e Segurança Hospitalar’ capítulo dedicado a “Responsabilidade Civil dos Profissionais da Saúde sob o olhar do direito”, Ed. Martinari. 2008

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